quarta-feira, 19 de dezembro de 2012

Arquivo II - Oscar Niemeyer



Eu estava no show da Madonna, quando Tatupai me disse que a notícia triste era a de que Niemeyer havia morrido. Senti vontade de chorar, com aquele sentimento de familiaridade que deve ter acometido tantos brasileiros. Mas resolvi que não. Chorar por quem, se a vida que havia ido parecia ter sido tão completa?  E não é pela falta de inteireza que devemos chorar? Pois vida longa à herança de Niemeyer. Aos seus sonhos, às suas curvas, aos seus brancos-cor.

Dois dias depois, no Ibirapuera, como já fiz outras vezes, fotografei alguns dos seus traços materializados. Arquivo-os aqui, então, como já havia feito quando ele fez 100 anos.
 




sábado, 15 de dezembro de 2012

Arquivo 1 – Madonna


O que me levou a desejar ir ao show da Madonna foi a curiosidade. Eu queria ver em “atividade” esta mulher que há tanto tempo povoa o imaginário de toda uma época – a que eu vivo. E ali, já no primeiro “ato”, diante daquela missa profana, eu penso ter compreendido. E me veio uma emoção muito intensa. 

Ocupei o lugar de muitos dos seus fãs, quando chorei e senti o coração dar um salto. E foi assim, de salto em salto, que, liberta do conhecimento, da crítica, presenciei cenas de amor, de não à intolerância, à falta de liberdade. Um banquete dionisíaco, milimetricamente delirante, no que se propõe a ser transgressor, violento, particular. Como em muito dos artistas a quem dedico profundo amor, o que penso ter visto foi um enfrentamento do horror que pode tanto nos fazer sucumbir quanto nos encaminhar para a glória. Madonna, sem dúvida alguma, escolheu a segunda opção.  Mesmo assim, ela não é uma simples popstar, embora domine como ninguém o que é próprio do pop. Madonna é um mundo. É uma daquelas artistas que parecem saber como transgredir a essência de uma época. Não custa lembrar que, quando ela surgiu, a época libertária do mundo havia passado tão rápido que nos custa a acreditar naquela história de “paz e amor”, livre de todos os dogmas. 

E cada vez que penso no que vi no show, mais faço comparações – e mais penso que alguns discursos, tão distintos dos de Madonna, quando parecem pregar o amor, mais espalham a intolerância. E ainda é aquele mesmo medo do riso, da alegria, da loucura, ora feia, ora bonita, que nos compõe. Enquanto esses discursos circularem, Madonnas não podem deixar de existir – naquilo que aponta também para o contraditório. Porque o contraditório não deve perecer. A beleza viva da contradição não deve se extinguir – para que haja arte. Para que haja o riso louco nas noites em que a chuva cai.

quinta-feira, 13 de dezembro de 2012

Depois de Sampa





Precisei ir muito longe. Não nesta viagem. Antes. Muito longe para me fazer lembrar do que me interessa, do que me importa, do que me leva.  Não que eu estivesse infeliz, porque não sou pessoa dada a infelicidades. E quem tem o dom de ter por perto “dois homens”, não há como pensar em infelicidades. Eu estava entristecida. Não encontrava a alma para desejar. E me sentia presa num presente que dia após dia me colocava diante de pessoas muito feias, espalhando suas aridezes no meu jardim em movimento. E sem desejo a vida me parecia turva. No meio do ano, o entristecimento era tão imenso que eu tinha a impressão de ser palpável. E foi como uma coisa que pode ser tocada que eu o encarei.  Precisei me perguntar: ser uma pessoa amarga e descrente do outro ou esta que ama largamente a possibilidade do contato com o outro – estes tantos outros que me instigaram a ser gente, simplesmente? Então, eu fui em frente. Passei a viver como se nada – coisa alguma, pessoa alguma – pudesse me tocar, me atacar. E a cada novo ataque, eu dei as costas. Insistentemente, eu dei as costas. Quanto mais adversidades, mais eu me pus para dentro, atravessando noites sem me permitir sequer pensar – apenas lendo, escrevendo, trabalhando. É porque me atirei com muita ânsia naquilo que sei fazer, que quero fazer. Como disse a algumas pessoas amadas que estranharam a minha urgência, eu precisava daquilo. Precisava do ímpeto – espécie de pedra fundamental. Porque eu me dei seis meses para sair do atoleiro em que havia me metido. Nenhum salvoconduto seja a quem for (salvo, evidentemente, e ainda, e sempre, aos meus dois homens amados). Porque havia um horror em mim. Se chegasse dezembro, e eu não tivesse feito nada do que havia intimamente me proposto, eu desmoronaria. E eu não queria dar trabalho a ninguém. Nem a mim. 

Pois dezembro chegou. E afora um “prazo” perdido, não por falta de tentativa, mas como um sobreaviso do próprio risco da urgência, posso agora dizer que fui muito mais longe do que havia traçado. E bem ali, quando o enfrentamento comigo havia me levado um pouco para longe, Tatupai me trouxe de volta lembrando que um milagre habitava em nós, em nossa casa, porque de fato éramos uma família muito bonita. Ao nosso redor, tudo respirava amor. A familinha que por tantas vezes nos faltou era a que amorosamente estávamos construindo. E que agora tínhamos como um dom. Era preciso, então, continuar o laborioso trabalho do cuidado. 

E foi assim que dezembro chegou. A urgência ainda habita em mim. Mas agora também o cuidado. O desejo de cuidar. E o desejar (naquilo mesmo que implica, infelizmente, num certo egoísmo). Como eu havia previsto há quatro anos, quando nos conhecemos, Tatupai não tentou impedir quando viu que eu precisava cumprir o desejo de ir – agora sem a ânsia. Precisava ir porque ainda sou uma “menina” – uma menina de 38 anos! – que quer “tudo aos tubos”, que quer ser contemporânea da beleza proposta pelo olhar do artista de agora. Então, eu vim. Por cinco dias, vim para São Paulo. Eu e minha amiga Rô. Um pouco para cuidar dela. Um pouco para lhe mostrar como a vida é bonita quando nos permitimos sentir – apenas sentir. Para lhe mostrar como São Paulo é muito além da chuva de dezembro que sempre cai. Muito além do “estacionamento ao ar livre”. Para lhe mostrar que São Paulo é a Bienal. É Antunes Filho. É Gero Camilo. É Nelson Baskerville. É Adriana Varejão. É Goeldi. É Abbas Kiarostami. É Alex Atala. E é um tanto mais.  

Então, se tudo der certo, o que eu farei neste “nenhum lugar”, por uns tempos, é o arquivo não dos dias que vêm, mas dos dias que passaram. Do agora agora até ao quase agora, alcançando o já muito distante.
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sábado, 10 de novembro de 2012

acordada

ainda estou acordada. não dormi. deveria estar dormindo. sei que deveria. mas agora que comecei a escrever, não consigo mais parar. não sei onde foi parar aquela Milena. ela era tão doce. tão doidivana. tão alheia a tudo isso. eu amava aquela moça que se espreguiçava naquele lugar tão pequeno com cortinas de tecido cru. e aquela moça que acordava às 11h da manhã, depois de ter dormido três horas, só para sair correndo para ver um filme. matinê. ainda existe? agora, onde estou? hoje gritei com meu filho. ou melhor, ontem. raro, isso. mas saber da raridade do gesto não me consola. queria nunca ser uma ausência para ele. e é o que tenho sido. ele me vê, mas não estou com ele. aí ele vem aqui, onde trabalho, e diz: "sai daí", como se dissesse: "não saia daqui de perto de mim".

mas não posso negar que também amo esta Milena. esta de agora - tão enclausurada nas suas determinações. sem me afastar um só milímetro do que tracei. nos planos. mas está doendo. está doendo de verdade. me sinto só. muito, muito só. desterrada neste lugar tão árido. e para dar um pouco de humor, me agarro à fantasia de que posso me cobrir de outra::: e Mariflor me vem na lembrança::: ela, que conseguiu sair de perto desta gente sem alma e agora está no mundo do supérfluo - no que isso contém de beleza. ela, espalhando cores pelas casas afora. eu poderia fazer o mesmo. cuidar da casa dos outros como cuido da minha. poderia?

por ora, eu apenas fujo. suporto a presença dos ódios porque, bem aqui, o que tenho é uma paixão. a paixão pela escrita. a paixão pelo fazer. aqui, rodeada dos meus livros, imersa na minha escrita, toda aridez desaparece. e é por isso que estou ainda acordada, enquanto meus dois homens dormem - e dão uma pausa na falta que sentem de mim. a minha falta deles só cabe a mim pagar. acordada, sem dormir.
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domingo, 4 de novembro de 2012

Das memórias da infância

(todo dia 26 do mês, escrevo aqui. a postagem deste mês foi esta. e foi especial, porque era o dia do meu niver).
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Num dia raro, meu irmão me disse: “Um dia, será assim: eu arrastanto os pés; você segurando nas paredes. Tavarim e Tia Elita. Ou vó Adauta. Ou tio Delbrando e tia Mariah”. Fui longe com esse dizer. Eu tinha 11 anos e uma imagem forte de amor: a do pai. Talvez duas: a da madrinha. Todo o resto eu sentia como uma nebulosa – até minha família mudar de cidade e eu estreitar os laços com meus avós e meus tios-avós paternos. Naquela época, a menina triste e alegre que eu era finalmente encontrou um lugar no mundo, o que é o mesmo que dizer que encontrei pessoas para amar. A família do meu pai sempre foi silenciosa. Entretanto um silêncio que acolhe. E tenho a impressão de que toda minha noção de família está contida nesses silêncios e naqueles poucos anos de convivência diária com eles, quando tive que partir aos 15 anos. Desde o princípio, um acolhimento mútuo: eles aprenderam a gostar de criança; eu aprendi a gostar de velhos. Velhos, sim, que, naquela época, ainda podíamos usar as palavras. Idosos seriam uma ofensa. Para mim, eles já haviam nascido velhos. Uma vez, espantei-me quando ouvi dizerem que minha avó havia sido enérgica e brava. Eu só conheci a delicadeza, os pés arrastando, as mãos amassando os farelos de pão, antes de levá-los à boca, sentada naquele velho fogão de lenha onde ela comeu até morrer.O único instante de morte que presenciei até hoje. Um longo minuto triste,  logo depois daquela correria que passou pelo átrio da igreja.
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Com minha voz estridente, eu corrompia os seus silêncios, até mesmo o de tio Manuel, um dos mais silenciosos, que às vezes vinha do sítio com balas no bolso. Nunca esqueci a última vez que o vi já despedida; ele montado em sua bicicleta, e eu, ao lado, em um equilíbrio precário. Nos abraçamos num soluço conjunto e ele disse: “Agora vá. E não esqueça este velho”. Talvez seja por isso que, apesar de estar sempre indo desde aquela época, eu nunca esqueço. E havia tia Expedita, casada com tio Sebastião, um dos homens mais delicados que já conheci. E dos que mais amei, daquele amor que adentra. Ainda hoje lembro de cada recanto da casa no fundo da igreja. Dela e dele. Ela tinha os pés tortos e pequenos e era engraçado vê-la equilibrando-se como que por magia. Era uma das mais falantes. Eu a ouvia contando suas histórias sempre com aquele pente na mão até deixá-lo na cabeça num equilíbrio também misterioso. Ela nunca foi capaz de me ver  como a magrela que eu fui na adolescência. Guardava nela meu corpo de bebê: tão gorda a ponto de me dar o apelido de um bicho nada bonito. Na última vez que a vi, ela já não se levantava da rede, mas continuava a fazer a pergunta que me presenteava a cada vez que eu voltava: “É Pebinha, é?” Os nomes e seus múltiplos. Para eles, nunca fui Milena. Tia Mariah me anunciava com a memória voltada para longe: “Ah, Delbrando, é Cláudia”. E ele respondia: “É mesmo, é Claudinha”. E da casa de tio Delbrando e tia Mariah, nunca saí sem algum trocado no bolso. Por mais que explicasse que não precisava mais, eles não entendiam. Se nunca deixei de estudar, então nunca deixei de precisar de dinheiro; é a lógica do cuidado que não ousava ferir quando já adulta e professora universitária. 
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De todos, a mais próxima foi tia Elita. Conversávamos horas a fio, sentadas em uma calçada alta que havia no fundo da casa e de onde eu via o pé de goiabeira do vizinho. E ela sempre respondia: “Eh, Cláudia, é você que tem que saber”. O que eu tinha que saber naquela idade já não lembro. Herdo seus gestos estranhos que ainda nos mantêm próximas, apesar da longa distância: ela com o lençol na cabeça; e eu, com ele na boca. As senhas com que ela me anunciava: “Lá vem bode velho arrastando os pés, igual à avó”. Depois, cuidávamos da casa dos meus avós onde ela sempre morou; uma casa estreita cheia de portas que ainda está lá, mas que não mais pertence à família. Jogávamos baldes e mais baldes de água que escorriam pelo longo corredor e desciam como cascata para a cozinha de piso inferior. Eu ainda esfregava com esponja um a um os fitilhos de plástico das cadeiras para tirar a sujeira das moscas. Em troca, ganhava amor, gorjetas e um prato de comida vez ou outra. Em suas casas, eu podia assaltar os potes de bolacha. Por isso, bolachas salgadas são minha madeleine. Elas trazem até a mim esses senhores e senhoras que me ensinaram e me ajudaram em um tanto de coisas. E assim como eu pensava que já nasceram velhos, ainda hoje costumo pensar que todos ainda estão lá e que a qualquer hora eu terei novamente 11-15 anos. 
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quinta-feira, 18 de outubro de 2012

Para o filho





Na delicadeza da hora de dormir, Poeminha, você se vira para mim e diz: "Mamãe, te amo". E antes que eu morra de emoção, você se vira para a Galinha pintadinha, que está ali para dormir com você, e, com a mesma voz doce, diz: "Piu-piu, te amo". Tem nada não, filho. Tá valendo. Dividir o seu amor com a galinha pintadinha não é nada, se você também me ama.
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segunda-feira, 15 de outubro de 2012

O espirito da prosa, de Cristovão Tezza

Numa viagem para Campina Grande, dei conta de ler dois livros e boa parte de um outro. Morar na mata cria distâncias medonhas: 30 horas de deslocamento. Li Faca, de Ronaldo Correia de Brito e O espírito da prosa, de Cristovão Tezza.  Estou tentando escrever sobre minhas leituras. Tentando enquadrar no sistema as minhas leituras e a minha escrita. Mas isso é assunto para outra hora. Por agora, fico com O espírito da prosa, de Cristovão Tezza. 

É um livro casmurro. Um livro de quem passou a vida tentando descobrir por que alguém vira escritor e apenas, agora, ainda que com desconfiança, parece ter encontrado alguma resposta. Tezza, muita gente sabe, é o autor de O filho eterno, que há uns três anos causou alvoroço no mundo da crítica, levando todos os grandes prêmios na área. Também senti um certo  alvoroço e, modéstia às favas, embora ainda estejam em minha gaveta, penso que escrevi algumas das palavras mais acertadas acerca do livro. Mas isso também é assunto para outra hora. 

O espírito da prosa. Se os críticos se detiverem sobre esse livro, Tezza vai levar umas boas cacetadas.  Não é um livro pra agradar. Com a mesma virulência com que fala de sua formação, com o mesmo descrédito que dá as suas primeiras tentativas de escrita, ele disserta sobre a literatura brasileira, sobre o que a constituiu, apontando como se sentiu sempre muito distante das grandes verdades de nosso tempo. Um inadequado. Abarca, para si, uma vontade de realismo. Ou um realismo. E diz que foi assim que pôs em pé suas personagens e sua literatura.  É um ensaio não sobre a literatura, mas sobre como ele, de forma persistente, colocou-a em sua vida.

Concordo com ele num ponto que, ultimamente, volta e meia vira pauta de discussão no meu entorno: a adesão irrestrita à ideia do apagamento do sujeito - e da representação - na literatura funda-se sobre uma inconsistência. Há muito o que se discutir sobre isso, sobretudo se pensarmos sob que bases esse pensamento foi constituído. Talvez ele tenha razão, e aderir sem nenhuma discussão a esses dois apagamentos seja de fato negar toda a história da prosa. Para pensar.

Agora dá para entender um pouco mais como ele conseguiu escrever um livro como O filho eterno. Há uma sequidão nas suas escolhas, e mesmo uma tristeza modelar. A mesma que compõe a sua literatura que, claro, não se resume apenas ao seu hit parade, mas a outros que igualmente valem a pena serem lidos. Eu aponto apenas três que já li: O fotógrafo, Juliano Pavolini e Trapo
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sexta-feira, 12 de outubro de 2012

o verbo "botar"

Bráulio Tavares no SELL
bráulio tavares veio aqui em vilhena. para o sell - evento acadêmico organizado pelo departamento em que trabalho. bráulio tavares me emocionou muitíssimo. que me desculpe o durval, autor do belíssimo livro "invenção do nordeste", que estou lendo, e talvez não concordasse com o que vou dizer, mas o "arrastado" do sotaque nordestino é bonito, é bonito, é bonito. talvez eu ache porque sou de lá, deste lugar fantasmático::: Nordeste. fiquei ali ouvindo, emocionada, o bráulio, por diversas vezes, usar o verbo "botar", quando normalmente se usa "colocar". havia musicalidade no seu jogo de palavras. no seu jeito contundente de dizer o que dizia. como dizia.

bráulio veio. e cantou numa manhã que seria cinzenta se não fosse a sua presença. e falou do ofício de escritor. falou do ofício da vida - a vida quando se tenta unir o que se quer e o que se pode. e eu, tão abestalhada fiquei, nem me importei em chorar ali, no meio daquela moçada. é porque bráulio me lembrou que na vida é preciso ter alegria, é preciso estar junto de quem inspira, de quem diz. e este aprendizado não tem preço. ele fica em nós pela vida inteira. e nos serve quando daqueles dias duros.

* Percebi, espantada, como escrevi pouco no blog durante este ano. Pouco mais de 10 postagens. E no meio do espanto, prometi a mim mesma que vou voltar a escrever com assiduidade. Muita coisa boa tem voltado, sobretudo dentro de mim.


quarta-feira, 19 de setembro de 2012

No ENLIJE e no GELNE

eu sempre achei tacanho o sistema de eventos acadêmicos. ou o sistema de apresentação de trabalhos em eventos acadêmicos. é como pedir por dois seguntos, peloamordedeus, a pessoas que estão surdas ao que você tem a dizer. mas minhas primeiras viagens, ainda na graduação, foram para participar de eventos. e há viagens memoráveis. como aquela em que eu e mari vimos uma peça de teatro pela primeira vez. como aquela em que viajamos eu, mari e manu. como aquela, com ida e mari. no frio de araraquara, no frio de são paulo. no tamanho da unicamp. ou no rio de janeiro. e em curitiba. e na bahia. e naquele evento em natal que encontrei arev e ed. e nos muitos que deixei de ir. e estas experiências sempre foram como um entremeio, pois nunca deixei de acompanhar os eventos de perto. gosto da experiência de ouvir. no último congresso da abralic, ouvindo márcio selligman, me veio uma alegria intensa, uma espécie de gratidão por poder estar ali, naquela manhã.

agora como organizadora do silic*, um evento acadêmico que, embora pequeno, numa cidade pequena, começa a ganhar corpo (e agora, quando tenho certeza do que quero), voltei aos eventos. não quero me alongar nisso. não quero mesmo dar explicações. estou provando das minhas resoluções. uma quase senhora disciplinada que agora escreve, que agora segue as normas, em nome de. em nome de. em nome de.

fui então ao gelne e ao enlije. siglas. encontros. pessoas. dizeres... e foi muito bom. muito bonito. mesmo o dia inteiro no hotel escrevendo o texto que já estava em mim. e que agora está nos anais do gelne. não sei quem lê. mas isso tem mesmo importância?

Poeminha foi junto. eu e a rô fomos cuidar dele. no nordeste. o nordeste é meu lar. dias antes, eu tentava dizer a um grupo de professores desesperançados que isso nada tem de determinista. o nosso lar nunca sai de nós. o sertão. isso não quer dizer que estamos presos a ele. há muito com  o que se rebelar. e é preciso se rebelar. sair de lá e voltar com aquela dor no peito. voltar para não ficar.

e encontrei mari. e nossa mariateresa. e carmi e makarios. e marcio e minha xará. e minha família. paimãeirmãssobrinhos. e manamácia ficou conosco pelas estradas.

eu gostaria de registrar tudo. é para isso que deve servir a escrita. para dizer sobre as tantas alegrias. mas me dá preguiça. quero guardar só para mim, embora saiba que vá esquecer daqui a pouco. então digo aqui. mas digo aos poucos. para guardar. 

* Simpósio de Literatura Brasileira Contemporânea. 

sexta-feira, 14 de setembro de 2012

cenas da disciplina


Cena de confissão: Entre a proposição da disciplina e a sua organização, um hiato. Desaparece a ambição de catalogação para dar lugar a uma obsessão ainda mais perigosa: a reflexão arbitrária ou intempestiva, como crianças que desistem de colecionar carrinhos para se dedicarem ao trabalho minucioso e exasperante de desmontagem. 

Como em todas as disciplinas, um reconhecimento com espanto da biblioteca. E com isso a impossibilidade de despregar da imagem de Barthes: “Biblioteca de um sujeito = uma identidade forte, completa, um ‘retrato’”. Diferente do despregar do conhecimento acerca de Barthes, cada vez mais distante. É a imagem que nos perfura. E é com a junção de duas bibliotecas que o curso se desloca.

Figura da disciplina: A amizade. Por diversas razões. A impressão de que a Universidade não consegue mais realizar a proximidade com essa figura (Derrida, Blanchot, Agamben). Colocar em cena o que está fora da cena (Derrida, Jean-Luc Nancy). Perfurar, rasurar, sustentar o subjétil da amizade, naquilo que ela tem de ambiguidade: uma necessidade e uma certa desconfiança (Nietzsche, Derrida, Artaud). O que pode sair daí? Quais sentidos poderão se constituir a partir da declaração da amizade?
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foi assim. foi uma experiência muito bonita. aquela, de dar aula no mestrado em estudos literários. tenho certeza de que para mais ninguém foi mais bonito do que para mim. a junção de duas coisas: o querer-fazer e o gostar muito de algumas pessoas que lá estavam. bonito estar num espaço em que mais se ama do que se é amado. sempre essa dissimetria entre professor e aluno. não contei quantas vezes tive que me deslocar de vilhena a porto velho. 12 horas de viagem. e um desejo: o de ensinar na pós-graduação. não fiz nenhuma exigência e aceitei todas as cláusulas. não sei muito bem o teor desta importância. mas me emocionou. e muito. quase passei pelo vexame de chorar em sala de aula no último dia. emoção e saudade são os nomes. criei uma figura para o curso: a da amizade. ministrei junto com binho, meu amigo de muito tempo. um amigo que amo. talvez aquela moça bonita que tenha me dito que meu lugar é na sala de aula daqui a um tempo vai me desferir algum golpe certeiro como outras fizeram, mas no momento eu só consigo pensar que ela tem toda a razão. porque é na sala de aula onde eu mais penso, onde mais quero aprender, onde mais estou em casa.
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