quarta-feira, 8 de maio de 2013

Kevin, ainda quero falar


O que há, precisamente, num filme como Precisamos falar sobre o Kevin (2011), de Lynne Ramsay, que só agora assisti, é uma contenção a que nos acostumamos a amar no cinema. Uma contenção que, ainda assim, está mais no corpo, nos gestos, da mãe. Talvez porque esteja próximo o dia das mães, talvez porque a relação com a minha nunca tenha sido a que eu desejei, senti-me profundamente tocada por esta mãe - a do filme. 

As resenhas que passei o olho pela Internet insistem que o filme faz uma relação muito direta com a inabilidade da mãe em lidar com a personalidade difícil do filho (e isso é quase um eufemismo). Não acho! Há essa inabilidade, há o filho com a personalidade doentia e, ainda assim, há o não-saber. Ainda que por diversas vezes o tempo vá e volte reconstituindo a vida de Kevin, a cena final ainda é que melhor especifica as razões do filme. Quando se pergunta a razão da barbárie, que é o mesmo que perguntar por que foi daquele jeito, e não de outro, Kevin já não sabe responder. As certezas que conduziram ao horror já não estão ali e resta uma reconciliação impossível. 

No fundo, estão todos mortos - sobretudo os vivos - e, por isso, o vermelho tinge a tela. E aí é preciso pensar no cinema como uma estética, mais do que como uma ética. Há o vermelho, mas também o branco.  Há beleza nessa ausência de rastros que só passa a existir depois do tingimento de vermelho. Ou seja, depois da dor. Até mesmo o quarto dos pais que era o único que trazia algo de próprio, do desejo do sujeito, é respingado pelo "antagonista", daí a assepsia dos outros lugares, desde o quarto de Kevin até a cozinha e a sala da enorme casa, que especificam bem a frieza das relações que não se completam: os pais que se amavam veem o amor interrompido pelo filho; a irmã que ama o irmão, que a odeia; a mãe que não chega a amar o filho que a odeia e a comunidade incapaz de compreender aquela mãe - porque ela própria vítima. E não deixa de incomodar este papel da comunidade - como se o horror estivesse mesmo em ter que viver ali, depois da perda de tudo, daí não poder ser diferente o fim - que parece encaminhar para o vazio, ainda que o branco da luz. O oposto do banho coletivo de sangue do início.

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Fui dormir doída. Sem Poeminha por aqui, que foi para a casa da avó a quilômetros de distância, só me restou uma dor difusa. 
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