quinta-feira, 19 de dezembro de 2013

do blog de paris

hoje, nem sei como, falei sobre o nenhum-lugar na sala de aula. acho que porque quero desmistificar um tanto de coisas. sei lá. arrependi-me logo depois, mas aí já era tarde. como sabem os que por aqui passam, escrevo para nada, por vontade de escrever. e escrevo de modo descontínuo, sobre o que interessa somente a mim, acho. como Paulo Honório diz, escrevo sobre coisas desimportantes e deixo de escrever sobre outras de mais valia (não é exatamente o que ele diz, mas escrevo de memória - a que não tenho).

e talvez para me certificar de que continuo em segurança, lembrei do blog de Paris, que era hospedado no weblogger, que encerrou todas as contas, e com isso lá se foram meus escritos nesse blog, que eu achava bem bonito (mas só eu achava). tinha uma caricatura minha feita pela Lan e era todo amarelo. senti saudade. sorte que tenho o arquivo. o que será daquela "moça" sete anos depois? agora, sou uma senhora. e tenho menos sonhos - e ainda menos certezas. talvez resultado de uma certa aridez da qual não consigo me despregar, por mais que tente.

fiquei, então, com insônia. a insônia que já me fazia falta. leio de forma descordenada o que não parece ter sido escrito por mim. ou parece? em 18 de dezembro de 2006, escrevi esta postagem, que coloco aqui - metade.


Sobre livros e conversas

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... Dizia a Mari tentando lhe explicar meus recuos: sou de uma geração fundada nas incertezas, nas dúvidas, na incompletude: não tenho certezas - só as das minhas aporias. E acho muito sacal a lógica do sucesso. Em quê? E para quê? Não tenho a segurança de dizer que foi graças a mim que estou aqui. Sou sempre tentada a dizer que foi apesar de mim. Ao menos esses recuos não me precipitam. Demoro, habito, mais em mim. Por muitas vezes só quero poder exercer a contradição: duvidar das possibilidades para não me carregar nem de sonhos nem de ideais. Porque se eles são reconfortantes (profissão, família, dinheiro na poupança), o que preciso ser e fazer para consegui-los é de uma brutalidade imensa comigo. Eu só quero continuar sem saber onde tudo isso vai dar. Acho que é cansativo para quem ouve; afinal só tenho intransigências: não acredito, não sei se vai ser assim, duvido que seja (em outras palavras: sou uma "pentelha", mas tenho algum humor!).

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Daí que os livros são este inatingível de nós. Se quero viver, ou se quero me esconder, se quero tentar, ou se quero negar, se quero planar, se quero; são aqui, com eles, com aqueles que vale, na claridade do assombro, que a vida ganha sentido.

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domingo, 15 de dezembro de 2013

Azul


Assisti à "Azul é a cor mais quente" numa tarde quente, reconciliada com uma cidade que desde sempre me estranhava. E quanto mais penso nele, no filme, mais gosto. Primeiro, ele me causou uma tristeza profunda, que veio de algum lugar pelo qual todos já passamos, o lugar de um grande amor que, apesar de ser grande, acaba por não dar certo. Não pensei em nenhum amor em especial, mas no próprio decurso da vida, na dificuldade dos dias, na exigência da vida, na falta de perdão do erro. 

É bonito e é bonito. Nada no filme de Abdellatif Kechiche é gratuito, nem mesmo, ou sobretudo, a tão comentada cena de sexo entre as protagonistas, Adèle e Emma. Caetano viu um certo esteticismo, que tem mesmo. Eu só consegui pensar, enquanto assistia, que todo ser vivente no mundo merecia ter sexo dessa maneira. E sim, sexo; sem eufemismos como "fazer amor"; sexo na mais pura carnalidade, capaz de levar ao êxtase e perdurar mesmo quando o amor acaba. E a cena no restaurante, em que as duas se encontram (perdão pelo spoiling), é a prova disso.  

É um filme que não pode prescindir dos seus atores, no caso, atrizes, pois seus rostos são de tal modo violados que chega a causar incômodo. Vem daí a proximidade que logo nos leva a pensar analogicamente. E esta talvez seja a grande tacada do filme. Só uma mente muito encaixotada colocaria o filme no gueto de filme gay, no intuito de diminuir seu alcance, embora a questão da homossexualidade feminina esteja ali o tempo todo. Quando as colegas interrogam Adèle, sentimos  o peso do preconceito e as odiamos veementemente. Dizer que é uma história de amor também não diz exatamente sobre o filme, embora, mais uma vez, seja uma afirmação exata.

Daí que o que realmente impressiona é o fato de, durante três horas, num filme com o elenco basicamente jovem, mantermo-nos presos a sua história, sem sentir o tempo passar. Por mais que enquanto assistia eu não pensasse nisso, somente um bom filme, que se utilize de todos os recursos para tanto, é capaz de nos prender desse modo. É o detalhe, como o azul, como uma cena que remete à outra e à outra, o trunfo deste filme. O detalhe é a sua beleza. 
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